terça-feira, 25 de agosto de 2009

Neblina


Acordei um tanto quanto confusa, como quase todos os dias, fiz minhas coisas rapidamente e bastante sonolenta. Estava até desanimada em relação ao dia que começava, esperava dele o nada, o mesmo que esperava dos outros. Eis, no entanto, que a surpresa surge, as coisas do mundo se entendem e, sorrateiramente, nos seduzem. De repente, elas vão tecendo as teias de nosso destino e remexendo as raízes mais profundas de nossa identidade.
Estava neste estado de alma quando girei a chave no portão e na rua deixei meu corpo entrar. Uma vez nela, meus olhos queimaram com a chama do novo, do inusitado, daquilo que sai do prosaico do cotidiano e decide cutucar a percepção e sensibilidade dos que ainda as tem. Creio que as minhas estão comigo já que me senti tocada profundamente pela paisagem matinal que a atmosfera derramava.
A neblina era o elemento básico desta manhã de segunda-feira. Ela tornava o mundo branco, escondia sua aparência banal e, por isso, parecia revelar sua essência pré-humana, divina. A neblina era úmida e à medida que nela eu entrava sentia-me atingida por essa umidade, como se todo meu corpo fosse se molhando e se distanciando da secura que até então eu em mim sentia. Ela me purificava. A neblina fascinou-me pela carga de mistério, pela novidade que ela trazia para o desenho daquela manhã. Manhã branca, úmida, sedutora, um tanto quanto neutra.
O fato é que eu existia naquela neblina e ela existia em mim. Eu caminhava dentro dela e já era toda sua umidade, brancura e neutralidade. Em meu pensamento que acordava considerei aquela manhã interessante, reflexiva, era como se ela combinasse o amor e o mistério produzindo a fórmula intraduzível da paixão. A neblina era uma espécie de modo negativo de ser, o ser e o não ser, era como uma verdade que me atraía e que, como todas as outras verdades de minha vida, me difamava, fazendo-me trafegar à beira do nada, remexendo meus contornos, alimentando meus medos, despertando a minha curiosidade. Esbocei vários sorrisos disfarçados enquanto minha alma experimentava aquela alegria típica do contato com o novo. A fumaça me trazia um pouco da loucura e eu não tinha medo dela. Estava sentindo, sentir já dizem é uma das formas de ser, portanto, eu sentia e era um rascunho de vida cada vez mais apaixonada pelo mundo, com todas as minhas saudades, com toda a minha liberdade - branca, úmida, fascinante.

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