terça-feira, 9 de março de 2010

Um pouco mais, um pouco menos, por Marcelo Masagão

O que dizer daquilo que se tem hoje, não se quer agora, quer se ver distante amanhã e, ao mesmo tempo, está revestido por um medo, uma falta, uma ausência tão farta quanto inútil. Algo que se tem, que se quer perder, e que se tem medo de sentir falta. Eis assim esta tal solidão. Estranho como a ausência de vozes, sons, gritos mudos e distantes fazem falta e chegam a enlouquecer a mente quando se ausentam por períodos demorados de tempo. O silêncio prolongado, depois que a alma cansa de dirigir-se a si mesma tão inutilmente, termina por deixar o corpo cansado, sem que se tenha saído do lugar, provoca dores no pescoço, nas pernas, nas costas, turva o pensamento, confunde os sentidos, no mesmo movimento em que, leva os sentidos a sua mais aguda e extasiante percepção. A voz quando de repente se solta, é tímida e estranha a si mesmo, distante, fantasmagórica, até as lembranças se perdem cansadas, embaçadas, juntam-se a um amontoado de restos despedaçados, em uns mais, em outros menos...



E o labirinto é extenso, não há como sair dele, sobretudo não há o que fazer, as alucinações se repetem, agigantam-se, a falta de tudo se faz imensa, multiplicada em proporções bem maiores, juntamente com o real tudo se faz profundamente irritante. A espera é interminável e torna-se insuportável nos dias quentes de sol, quando tudo lá fora é lindo e tudo lá dentro é cinza, abafado e pobre. Mas se sairmos, a multidão nos esmaga, os olhares nos estilhaçam, a diluição do tempo, das imagens, da lógica, a fruição do tempo, o anestesiamento dos sentidos, nos faz mais malucos do que quando encerrados na nossa prisão de cada dia. O mundo atual e suas grandiosidades falhas fere. Estão todos correndo, desesperados, afoitos, amedrontados, estão todos ansiosos por viver, consumir, consumir-se, deteriorar-se, estagnar-se, inchar-se sem nutrir-se. O mundo está alvoroçado, desesperado, frenético e vazio, tremendamente perdido, iludindo-se com multidões de pessoas e objetos, buscando encontrar-se dentro do seu próprio vazio, e assim, enfeitam cada vez mais sua gaiola dourada, enfastiam-se dela, mas se saírem são engolidos pelo bichos que espreitam do lado de fora dela, a gaiola pode ser um quarto, um longo edifício, uma cidade a perder-se de vista, pode ser do tamanho do corpo, um pouco mais, um pouco menos...



Sobretudo há um cansaço, tédio irresoluto de tudo que ainda passa despercebido nas almas de muitos, mas não demorará demasiado para vir à tona, basta perceber que tudo isso é um completo caos sem sentido, que toda espera torna-se longa e ressecada, que todo sentimento grande e verdadeiro demais é anulado ou pisoteado por outro extremamente medíocre e embalado por uma casmurrice que se supõe altiva e superior, mas termina rastejante e pálida.
Enfim, sinto como se o mundo estivesse perdido nas raias da contemporaneidade, afogando-se nesta onda de coisas e mais coisas sem sentido, perdendo a essência, a plenitude, a beleza de um verso, de uma tela com cor e ritmo. São muitas janelas, tantos pequenos buracos, empilhando histórias e mais histórias, cada buraco tem uma história, cada história um buraco...
Se a solidão de dentro enlouquece, o vazio de fora entontece e massacra. Antes a loucura da solidão, ao caminhar sem rumo encravado no seio de tantas e estranhas multidões, sozinhas, perdidas no que fizeram delas seus desejos, nos desejos que elas fizeram...
A alma está profundamente confusa e cansada, presa em sua gaiola dourada, tentando escapar dela, esperando do outro o que não vem dela mesma, mas um dia se desprenderá, voará livre e longamente, entrará na paz de um deserto de formas parecidas e será invadida pela claridade crepuscular do sol que mergulha delicadamente na linha do horizonte. Um dia, em sonhos que seja, serão ditas frases, de um jeito e com um significado, que vai além das palavras, além, um pouco mais, um pouco menos...

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