terça-feira, 21 de julho de 2009

"O jornalismo tem que ter literatura", diz Gay Talese

O jornalista e escritor Gay Talese



O jornalista e escritor norte-americano Gay Talese foi o entrevistado do programa Roda Viva da TV Cultura exibido nesta segunda-feira, 20 de julho de 2009. Gay Talese se tornou um dos expoentes do gênero literário mais conhecido como New Journalism – uma inovação de origem um tanto incerta, surgida principalmente nas revistas Esquire, Haper’s, e The New Yorker, ao lado de outros nomes como Truman Capote e Tom Wolf. O New Journalism é um jornalismo de não-ficção, ou seja, ele se baseia em fatos da realidade, do cotidiano, mas os relata de uma forma um pouco diferente do modelo tradicional, dando aos acontecimentos um toque literário, um olhar mais amplo, profundo e humano.
Muitos críticos ao New Journalism dizem que os autores deste gênero deturpam os fatos para conseguir um maior efeito dramático, afirmação que o próprio Talese contesta em seu livro Fama e Anonimato. Neste, Talese afirma que embora, muitas vezes, o novo jornalismo seja lido como ficção, ele não é ficção. Segundo o jornalista e escritor, ele é, ou pelo menos deveria ser, tão fidedigno quanto a mais fidedigna reportagem, embora busque uma verdade mais ampla que a obtida pela mera compilação de fatos passíveis de verificação, pelo uso de aspas e observância dos rígidos princípios organizacionais a moda antiga. Ainda segundo Talese, o novo jornalismo permite uma abordagem mais imaginativa da reportagem, possibilitando que o narrador se insira na narrativa ou assuma uma postura mais neutra diante dos fatos e dos personagens que compõem uma história a ser contada.
Mas, New Journalism a parte, a entrevista de Talese no Roda Viva teve muitos pontos positivos. O jornalista mostrou em cada pergunta sua facilidade com as palavras, sua fala natural e articulada, seu raciocínio lógico, seus valores morais e pessoais. Ele falou do jornalismo como alguém que realmente vive e é apaixonado pelo que faz. Enumerou os princípios básicos que devem orientar o jornalista em sua profissão. Segundo Talese seriam eles: curiosidade, busca pela exatidão e precisão e, o que ele considera o mais importante, capacidade de produzir um bom texto, se possível com literatura. Ao falar de exatidão e precisão, o jornalista ressaltou que estas são mais importantes que a velocidade ou a rapidez na apuração de um fato. Não concorda com os jornalistas que são obcecados por furos. Segundo Talese, um bom jornalismo se faz com precisão, responsabilidade e isenção. Ele não se importa de passar meses pesquisando um tema, mergulhado na vida de algum personagem, nos cenários de algum lugar. O importante é reunir dados suficientes para que no final você possa produzir uma boa reportagem, diz Talese. E aí entra o ponto mais interessante de sua entrevista: o texto jornalístico. Ele disse que de nada adianta curiosidade, apuração ou precisão se o jornalista não for capaz de elaborar um bom texto, de saber distribuir as palavras, equilibrar as impressões e transmitir para um pedaço de papel a realidade por ele vista da forma mais clara e harmoniosa possível, o que só se consegue com um conhecimento profundo da língua com a qual se escreve. É necessário compreender suas regras e seus recursos literários. Por isso, em sua opinião, um bom texto tem que ter literatura.
A literatura, quando bem utilizada, enriquece o relato, tornando-o mais interessante e rico. Talese lembra que quando lemos um romance de ficção nos interessamos pela história, nos identificamos com personagens ali retratados e somos envolvidos pelo correto e sedutor uso da linguagem, ou seja, somos seduzidos pela literatura. Um texto de não-ficção deveria ser tão bem escrito a ponto de provocar o mesmo efeito, envolvendo o leitor nos fatos da realidade, não nas espirais da imaginação e da fantasia, mas envolvendo-o a ponto de tornar a realidade algo tão interessante e importante quanto um bom romance. O essencial é perceber que a literatura pode estar presente no jornalismo de maneiras muito sutis, em textos puramente informativos, que visam a objetividade, ou em textos como crônicas e perfis, que já adotam e admitem um tom mais poético.
Além de defender a literatura como forma de enriquecer o texto jornalístico sem que este perca sua função originalmente informativa, Talese falou da importância de estar com as pessoas, de manter uma boa relação com as fontes, tornar-se quase que íntimo delas, ganhando a sua confiança. Defendeu o contato humano, real, em detrimento da mediação tecnológica, cada vez mais freqüente e comum no jornalismo atual.
Quando perguntado a respeito da formação necessária para se tornar um bom jornalista, Talese disse que não acredita que alguém se forme jornalista, para ele, o jornalista de verdade precisa ter algo dentro dele que o chame para o jornalismo, algo que vai muito além de técnicas, aparências, furos e passa muito perto da determinação, vontade, persistência, paixão pelas pessoas, pelas histórias e pela palavra escrita.

Nenhum comentário: